Para minha surpresa, no primeiro dia de julgamento, apenas 4x2 pró-embragos. Mais surpreendente ainda foi o segundo dia, que terminou empatado em 5x5, faltando apenas o voto de minerva. Durante uma semana, passei a ter esperanças de que o improvável pudesse acontecer e que os embargos infringentes poderiam ser negados. Apesar de entender que os embargos infringentes fossem legais e de alguns amigos terem me alertado que o Ministro Celso de Mello, há alguns meses, já havia se manifestado a favor do tema, eu quis acreditar que eles poderiam ser negados. Torci muito para isso, mas, ... mas,... não deu!
Agora a opinião pública "caiu de pau". Acusa os juízes de contribuir para a impunidade, de beneficiar os corruptos e até de trabalhar para os interesses dos poderosos. Para muitos, o STF "caiu nos seus conceitos" como instituição e deu um atestado de aprovação à roubalheira. A verdade é que, antes das críticas ferozes direcionadas a quem votou a favor, se a grande maioria das pessoas comuns entendessem um pouquinho mais tecnicamente o que de fato estava sendo julgado, saberia que não foi bem assim. Todos nós torcemos para que os mensaleiros sejam punidos o mais dura e rapidamente possível, mas nossa emoção não pode se sobrepor à razão.
Em primeiro lugar, o julgamento da admissibilidade dos embargos não estava avaliando o mérito dos processos. Em outras palavras, não julgava se Dirceu e seus "companheiros" eram ou não inocentes ou se deviam ou não ir para a cadeia. Julgava, sim, se o recurso por eles requerido era ou não válido, pois havia divergência na Corte. E essa dúvida que surgiu, por acaso, justamente no processo do Mensalão, precisaria ser tirada, pois, a partir de agora, valerá para todo e qualquer julgamento do STF. Em segundo lugar, a questão não era se os "embargos infringentes dos mensaleiros" eram ou não legais, mas sim se "embargo infringente" como recurso, independentemente do processo, deve ou não ser acolhido na última instância do judiciário. Não sou magistrado, nem estudante de Direito, mas, pelo pouco que procurei me informar sobre o tema, acredito ser legal, pois está previsto no Regimento Interno do STF e não há Lei que o tenha revogado. Então, só nos resta lamentar. Além do mais, não é correto afirmar que o resultado da análise dos embargos infringentes transformou o julgamento do Mensalão em uma "grande pizza". Não é verdade, pois ninguém foi absolvido, apenar confirmou o direito de alguns dos mensaleiros terem seus julgamentos revistos, dentro da Lei. É claro que qualquer revisão abre a possibilidade de mudar o resultado, mas os julgadores serão os mesmos que, no primeiro julgamento, condenaram. Então, esperemos que as penas sejam mantidas (Oremos!).
Não surpreende que o STF tenha dirimido a dúvida, decidindo pela validade do recurso. O mais surpreendente nesta decisão foi o placar apertado: 6 a 5. Não entendo como os ministros do Supremo, pessoas estudadas e teoricamente preparadas para julgar com independência, imparcialidade e serenidade, de forma "fria" e "cega" (como a Justiça deve ser), sem levar em consideração desejos pessoais e emoção e com base apenas no que diz a Lei, possam divergir tanto. Aliás, o voto do Ministro Celso, até por ter sido o último, rebateu muitos argumentos dos que votaram antes dele. Seu voto foi uma verdadeira aula de Direito. Doa em quem doer. Muitos dos seus argumentos (para nossa infelicidade) considero tecnicamente perfeitos, entre eles, os seguintes:
- [Juízes] não podem deixar contaminar-se por juízos paralelos resultantes de manifestações da opinião pública que objetivem condicionar a manifestação de juízes e tribunais.
- O direito ao duplo grau de jurisdição é indispensável. Não existem ressalvas [quanto a isso] pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.
- Embora todo o poder emane do povo, a representação popular junto ao Poder Judiciário não é exercida diretamente e, portanto, não se dá no campo das escolhas políticas, mas da aplicação do Direito.
- Ninguém, independente da gravidade do crime cometido, pode ser privado das garantias fundamentais do direito de defesa, independente da vontade antagônica da coletividade.
- Por fim, sobre a dúvida se a Lei 8038/90 teria revogado a existência de embargos infringentes no Regimento do STF, argumentou que a Lei não tratou da extinção deles no STF e que cabe ao Poder Legislativo decidir, com exclusividade, sobre a extinção ou não da norma. Além disso, que, inclusive, projeto de lei já havia sido enviado ao Congresso, anteriormente, pedindo a extinção dos embargos infringentes e foi por este rejeitada.
Não adianta reclamar do STF, nem do ministro A ou ministro B. O recurso existe, é legal e foi (tecnicamente falando) corretamente aceito. Temos que reclamar e lamentar muito, sim, é do fato de isso estar previsto na legislação judiciária. O direito à ampla defesa e do contraditório é justo. O que está errado é essa quase eterna possibilidade de recursos existir, pois só adia as decisões finais e termina por beneficiar os réus de tal forma que os torna praticamente impunes. Essa Legislação precisa mudar. Ela deve garantir sim o direito de defesa, mas também precisa garantir a razoável duração dos processos para permitir que os mesmos possam chegar ao final e que os criminosos possam começar a ser punidos. No caso específico do Mensalão, chega a ser revoltante ver que o maior escândalo de corrupção da história do país, que se tornou público desde o ano de 2005, ainda não tem seu julgamento concluído e que ninguém ainda foi preso. Mais revoltante ainda é saber que, devido ao acolhimento dos embargos infringentes, o "rejulgamento" poderá adiar tanto a decisão final que muitos dos crimes poderão prescrever e muitos dos "pré-condenados" ficarão impunes. Queremos acreditar que "a Justiça tarda, mas não falha", mas dói saber que, na prática, "ela não é feita porque tanto se retarda".
Carlos, tudo bom? Nas corridas ainda, camarada?
ResponderExcluirOs embargos, como você bem explicou, não são mais que obediência a Lei. Causa apreensão e estranheza é não ter havido unanimidade num assunto cristalino, assim como a perda de mandatos - prerrogativa exclusiva da casa legislativa, como manda a constituição.
Esse julgamento mostrou aberrações, como a prisão antecipada dos "mensaleiros" antes do trânsito em julgado da sentença condenatória o que mostra, na minha opinião, que no Brasil tudo continua como antes: são os mesmos que torcem as leis e saem impunes e os movimentos populares seguem marginalizados.
Tudo de bom!
Oi, Adriano. Estou correndo mais não (outras prioridades no momento).
ExcluirÉ verdade que muita coisa estranha tem acontecido no julgamento. A ânsia de fazer justiça de alguns ministros tem se sobreposto ao que diz a Lei. A sociedade, que tem apoiado alguns desmandos para que os bandidos sejam logo punidos, não sabe o perigo que representa para ela mesma um Estado descumprir as leis no mais alto escalão do judiciário.