sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Desocupe-se! Despreocupe-se! Aprendendo a viver melhor.

Um grupo de amigos homens faz uma confraternização e reúne suas famílias (esposas e filhos). Algumas esposas, com pouca intimidade, começam a conversar:

- O seu marido participa do futebol nas terças-feiras?
- Sim. Menina, nem te conto! Isso me preocupa tanto. Ele sai de casa às 8 da noite e volta somente a meia-noite, suado e cheirando a cerveja.
- O meu também. 
- O que mais me preocupa é que isso acontece em um dia de semana. Ele vai dormir tarde, mesmo tendo que acordar as 6 da manhã, no dia seguinte, para trabalhar. 
- Meu marido também. Não sei como ele aguenta sair de casa no dia seguinte. O pior é que ele acorda cansado, mas, quando falta a este futebol, passa o dia todo irritado. 

Esse papo de esposas foi verídico. Ele conta um pouco da história de um grupo de amigos, amantes do futebol e apreciadores de uma "geladinha". Os encontros ocorrem semanalmente, em média com uma hora de futebol e duas horas de cerveja. Mas o que motiva pais de família, cada um com suas responsabilidades, a abdicarem de boas horas de sono, no começo de cada semana, em troca de alguns horas de futebol, cerveja e cansaço no dia seguinte? É simples: o bem-estar proporcionado pelo encontro com os amigos.

Apesar do cansaço físico, esses nobres peladeiros, na verdade, estão descansando. Isso mesmo! Descansando a mente. O segredo está aí. Todos nós temos nossas preocupações, nossos dilemas, nossos problemas. Tudo isso consome parte de nossas horas diárias, nos cansa e nos sufoca. Uma das receitas para viver bem é justamente "desocupar" nosso cérebro de tudo isso por alguns momentos. Momentos, esses, que devem ser preenchidos com atividades prazerosas e sem qualquer ligação com aquilo que nos preocupa. É como se estes momentos "massageassem" nossa mente e desintoxicassem nosso corpo das angústias diárias. Sem momentos assim, as pessoas tendem a ficar pensando o tempo todo em seus problemas, em constante estado de alerta e estresse. Isso é extremamente ruim.

Essa turma de amigos se desliga dos problemas com futebol e cerveja. As esposas talvez nunca entendam completamente (apesar de aceitarem), mas alguns estudos, inclusive, afirmam que essa prática de juntar amigos para jogar conversa fora numa mesa de bar é bastante saudável, pois proporciona bem-estar e fortalece as amizades, como pode ser lido neste artigo (Beber com os amigos duas vezes por semana pode ser benéfico)

Apesar do exemplo mencionado, o ensinamento que fica, não necessariamente passa por futebol ou cerveja, mas sim por ocupar-nos, com certa frequência, com alguma atividade diversa daquelas que nos ocupam e trazem preocupações constantes. É isso que esta turma faz, de verdade. Se o cansaço desses amigos no dia seguinte é físico, pode ter certeza que suas mentes estão descansadas, tranquilas, mais calmas e felizes. Pode se dizer até que mais bem preparadas para vencer os desafios do que se passassem todo o tempo preocupadas com eles.

Então, nada de ficar o tempo todo pensando nos problemas do trabalho, pensando nos problemas de famílias ou do condomínio, nas finanças ou mesmo se preocupando com algo ruim que possa estar para acontecer. Afinal, a própria palavra preocupação já denota que você está apenas se pré-ocupando, ou seja, ficando ocupado antes da hora. Reserve momentos para fazer algo que lhe dê prazer, algo que exercite sua imaginação e seu corpo. Principalmente, atividades que envolvam interação com outras pessoas. Socializar-se faz bem. Pense, sim, nos seus problemas, planeje como resolvê-los e enfrente-os com determinação, mas se lembre que se desocupar por certos momentos é fundamental. Lembre-se que esquecê-los por alguns instantes vai ajudar a enfrentá-los com menos sofrimento e, quem sabe, até com mais prazer. Essa turma do futebol sabe disso. Ótimo para eles! Pode ser para você também.

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Biografias: entre a livre expressão e o direito à privacidade

"Posso não concordar com uma palavra do que dizes, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-las". Foi François Marie Arouet, mais conhecido como Voltaire, quem pronunciou esta frase no século XVIII. Onde quer que hoje esteja, Voltaire deve se remoer todo ao assistir de camarote à polêmica atual em torno das biografias não autorizadas.

Voltaire defendia a liberdade de expressão, algo que em nossa sociedade atual, felizmente, é considerado senso comum. A Constituição Federal atual garante a liberdade de expressão, mas o Código Civil, em nome da defesa à vida privada, prevê que a publicação de biografias dependa de prévia autorização do biografado ou de sua família (quando não vivo). A polêmica surgiu quando esta previsão começou a ser questionada. Hoje, a questão é discutida no Congresso Nacional, através de um projeto para mudar o Código Civil, e também no STF, onde a constitucionalidade dos artigos do Código Civil, referentes ao assunto, é questionada. Contrário às mudanças está o movimento Procure Saber, encampado por alguns artistas de renome, que defendem o direito à privacidade.


É perfeitamente compreensível o posicionamento dos artistas. Afinal, quem gostaria de ver publicados fatos verídicos do seu passado dos quais se envergonha? Quase todo mundo tem algo no seu passado que não gosta de ser discutido ou mesmo revelado. Ocorre com pessoas anônimas, quanto mais com pessoas conhecidas. E quando os fatos narrados não são verídicos ou mesmo não comprovados (boatos, fofocas,...)? Neste caso, as consequências para as pessoas publicamente expostas são duradoras, mesmo que a verdade venha a ser somente mais tarde conhecida. Enfim, eu vos entendo, caros artistas, mas não concordo com vocês!


Comparemos uma biografia, a matérias de jornais, revistas ou blogs. Quando matérias como estas são escritas, elas dizem, basicamente, que ALGUÉM acabou de FAZER ISSO ou que acabou de DIZER AQUILO. Em suma, uma matéria de jornal, revista ou blog conta fatos sobre alguém que estão acontecendo (presente). Uma biografia, pobremente falando, nada mais é do que a narração de fatos que ocorreram (passado). Em outras palavras, é como se os jornais, revistas e blogs escrevessem partes de uma biografia diariamente, em tempo quase real. A diferença básica entre elas é apenas temporal. Se é permitido reportar a vida de alguém em tempo real, por que seria proibido reportar um resgate do passado deste mesmo alguém? 


A liberdade de expressão é importante, mas, certamente, deve ter limites. O direito de expôr pensamentos, ideias e opiniões ou, simplesmente, de relatar informações deve ser garantido, porém a responsabilidade pelo que é exposto deve ser um dever que acompanhe sempre esse direito. A verdade deve ser o primeiro compromisso de quem quer ser "livre para expôr" o que pensa, da mesma forma que as consequências por calúnias, difamações e injúrias proferidas. Assim, os biografados devem ter o direito de não reconhecer as biografias, mas não de proibi-las simplesmente por não concordar com elas. É admissível que os fatos nelas relatados sejam questionados judicialmente e, até mesmo, que a obra seja, posteriormente, devido a isso, proibida. É admissível que o autor seja processado quando falte com a verdade ou insinue situações que firam a honra do biografado. Mas é inadmissível a publicação seja previamente censurada.


Os debates sobre as biografias têm se concentrado, sobremaneira, na questão da privacidade, pois tem se pensado muito em biografias apenas de artistas (cantores, atores, atletas, ..), mas não devemos nos esquecer das biografias de outras personalidades de relevância histórica. Lembremos que a vida de políticos, pensadores, revolucionários e outros ícones históricos também são alvos de biografias. Não é razoável pensar que biografias do ex-presidente Lula, ou do ex-presidente Collor, ou do poeta Ariano Suassuna ou de Chico Mendes só possam ser feitas com o consentimento dos mesmos ou de suas famílias. Uma biografia que só traga fatos autorizados pelo personagem não é uma biografia, é apenas um relato positivo para exaltá-lo. O interesse histórico é suficientemente relevante para justificar a obra, mesmo a contragosto do personagem em questão. Claro, sempre pautada na verdade.


A grande questão em jogo é saber qual o limite da liberdade. Até que ponto a verdade pode ferir a honra ou ser considerada difamação? Como provar que os fatos narrados podem ser inverdades? Como comprovar a boa-fé do autor? Como separar a liberdade de expressão da invasão de privacidade. Esses são os pontos mais complexos que necessitam de maior discussão e aprimoramentos, não a proibição de biografias não autorizadas. Estas, pelo menos para mim, não deveriam ser pura e simplesmente pré-censuradas.